27 de janeiro de 2022

Vive numa busca incessante

Jussara perguntou ao imaginário: Quando que tu vais embora? Nos últimos anos se viu presa numa busca incessante, achando e perdendo viciosamente. Se entregou, deixou seu coração, e partiu em busca do onírico. O céu estava num azul marinho, repleto de constelações que a guiavam na busca por Órion. No meio do caminho tropeçou, achou um pedaço seu que estava guardado; continuou. Foram galhos quebrados, criaturas hospedeiras que lhe sugavam, memórias pregressas recheando o vácuo mental. 

Andou sem fim, estava só, como sempre esteve, caminhando pelas vias públicas e concretadas após uma longa jornada gramínea. Olhava atônita, confusa, sem rumo. Reflexos do sol tornando carvão sua pele preta. Ju estava perdida. Virando pros lados sem lembrar o que procurar. Cruzou a rua de paralelepípedos e trombou num bondoso artrópode chamado Cajo. Semelhantes em quitina, numa afeição repentina, deram as patas. Jussara estava radiante sem saber porque. O reflexo solar em sua crosta refletia, agora, uma cintilante luz de alegria. Passaram um tempo juntos. Sorriram com seus dentes inexistentes, dançaram, dormiram, se juntaram. Passaram momentos felizes, de riso puro, escolhendo, sem escolher, um ao outro. Um dia ela acordou sem entender. Virou para os lados tentando lembrar onde ele se metera. Achou uma carta escrita a próprio punho:

“Minha querida, escolhi, por não me escolher, partir sem querer. Passe bem, um dia a gente se vê.”

Murchou. As pernas falharam, a garganta secou, olhos marejaram, e novamente se viu sozinha em busca do que já não se lembra mais. Sua cabeça estava lotada, de memórias e vontades, ocupando um espaço intocável. Remoeu e se escondeu num muro cheio de lamentações. Passou os dias sem fim numa completa solidão, olhando o interno sem ver nada. O vazio deixado, as incertezas guardadas, o sentimento em avulsão pronto pra rasgar. Mas um dia a quitina precisa renovar. Jussara sabe bem disso então aguarda por esse dia lembrando sem parar os momentos achados.

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